segunda-feira, 11 de julho de 2011

Papo de boteco

Algumas histórias exercem um enorme fascínio sobre mim. Simplesmente porque conversam comigo de uma maneira que me leva para dentro de mim mesma (egocêntrica???? eu?????).

Assim foi quando li A Alma Imoral de Nilton Bonder. Um livro para ser digerido com calma, parando de tempos em tempos para amadurecer cada pensamento. No teatro não há este tempo, o que torna este monólogo verdadeiramente intenso, uma verdadeira explosão de sentimentos que me fez lacrimejar ao me enxergar tão claramente (livro e peça altamente recomendados).

Entre os temas abordados pelo autor, a transgressão é um dos mais importantes. A tradição vs a traição.

Enfim, porque comentar disto aqui? Você já vai entender.

Neste fim de semana em meio às conversas de boteco (assuntos assim só surgem mesmo em boteco depois de muitas cervejas, tenho verdadeira paixão por estas conversas) fiz um paralelo explicando as tradições e traições a partir da cerveja. Claramente de maneira livre e nada pretensiosa sem a menor intenção de convencer. Apenas uma brincadeira com conceitos.

Vamos lá, as regras determinam um jeito certo de se consumir cerveja. Um jeito certo de produzir, servir, girar a taça, sentir a cerveja de tal maneira a melhor aproveitá-la. Essa é a tradição, a moralidade que reveste cada gole. Que poda a inspiração e a criatividade.

Já as traições são as quebras dessas regras. Algo que acontece de um desejo momentâneo que nos leva a fazer tudo errado e achar que ficou ainda melhor. As traições é que nos levam a descobrirmos nosso jeito próprio de beber cerveja. Longe de certo e errado.

Para os mais puristas, as tradições são mais importantes que as traições. Mas eles se esquecem que são as traições que levaram e levam à descoberta de novas formas de se produzir e consumir a cerveja do dia a dia.

Algo que aprendemos logo que começamos a degustar cervejas é que seu armazenamento deve ser em pé, e nunca, jamais em hipótese alguma congelar. Congelar a cerveja acaba com ela. Estraga sua cor, o sabor fica aguado, a espuma perde textura... ou seja, fica simplesmente impossível de ser devidamente apreciada.

Receber uma cerveja congelada na mesa, portanto é motivo suficiente para reclamações e estresse com o garçom, além de uma dor profunda pelo desperdício de cerveja, certo?

Não exatamente, porque ao ver aqueles pequenos floquinhos de gelo caindo no copo meus olhos já começam a brilhar. Para mim é lindo ver o copo trifásico. Uma camada fina de floquinhos entre a espuma e a cerveja. Muitas boas recordações invadem minha mente. Me fazem reafirmar que cerveja não é só cerveja. Ela não se limita à muitas regras de produção e degustação. Cada copo tem uma história, cada copo traz em si uma sensação única que não pode ser simplificada em meros certos e errados de uma cartilha.

Agora chegamos à analise desta transgressão. Porque se as regras são as tradições e descumprí-las são as traições, precisamos apenas demonstrar como essa transgressão possui em sua essência aquilo que nos levará a um novo lugar e a ter uma nova visão sobre os fatos. Algo que amplie a nossa compreensão da situação e nos livre de preconceitos.

Então encontramos no meio do caminho a michelada mexicana (michelada, Michelle... Freud explica?). Os mexicanos tem um jeito muito peculiar de tomar cerveja. Colocam sal na borda do copo (como na margarita), dois dedos de suco de limão, cerveja e gelo. Sim, gelo.

Confesso que não sou muito fã de micheladas não. Acho que o gosto da cerveja fica tremendamente encoberto pelo sal e pelo limão, e sal e limão me remetem mesmo é à tequila e não à cerveja. Mas será que poderíamos condenar um jeito tão particular de saborear a cerveja em um dia escaldante?

Imagino agora os tradicionalistas contorcendo-se de ódio dessa transgressão às regras.

O importante, que fique claro, não é gostar do resultado obtido, mas libertar-se de preconceitos tolos e aprender que não existe apenas uma maneira correta de se fazer nada na vida. Nada melhor do que criar as próprias regras.

Concluindo. Cada um cada um, cada copo uma nova oportunidade de transgredir, ousar, descobrir-se e redescobrir-se...

Neste ponto da conversa, levanto meu copo trifásico e trincante e brindo sentindo-me absolvida por ser completamente apaixonada por cerveja em flocos. Por mais errado que isto possa parecer aos olhos dos outros...

2 comentários:

  1. Queria eu estar nessa discussão regada à cerveja. Concordo em gênero, número e grau. Traições fazer parte até mesmo da produção de tantas cervejas quase-perfeitas que conhecemos por aí... a Innis seria um whisky, a Brew Dog (a mesma que tem a versão com viagra) tem uma versão que usa o congelamento na produção, fruta em cerveja, Michelladas (no meu caso assim mesmo, com dois "L") que eu tanto adoro... Mas... tradições nos colocam no eixo e nos dão argumento. Pelo visto, tenho tanto a comentar sobre o assunto que invoco uma segunda sessão de conversas de boteco, com a Isa, creio eu. Não?

    Ainda, este post me lembrou uma conversa que tive há uns 2 ou 3 meses, sobre escrever um post de cerveja de uma perspectiva um tanto audaciosa: estando bêbado. Isso mudaria os conceitos e colocaria, talvez, mais personalidade e menos técnica no texto. Traição ou tradição?

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  2. Voto por um post de vídeo, gravar uma conversa de boteco e simplesmente postá-la, sem edição!!!

    Filosofias de boteco mil ao lado da Isa, ela sem dúvida tem que etar na mesa nessa data!

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